Caros Internautas

Bem vindos ao sítio internet da Associação Intermunicipal de Água da Região de Setúbal – AIA. Aqui procuramos dar-lhe conta das actividades de cooperação da nossa comunidade intermunicipal, no âmbito do Serviço Público de abastecimento de água às populações e da preservação dos recursos hídricos da Região.

AIA
A AIA manifesta-se contra a proposta da Comissão Europeia de eliminação da aplicação da Taxa Reduzida do IVA na água

No âmbito do processo de harmonização fiscal pretendido pela EU a Comissão Europeia lançou uma consulta pública onde propõe a revisão dos atuais regimes de IVA (Consultation paper Review of existing legislation on VAT reduced rates, adopted by the Commission in December 2011). Entre outros aspetos a Comissão aponta aquilo que considera ser uma incoerência entre as políticas ambientais e de desincentivo ao consumo de água e a aplicação de taxas reduzidas de IVA nos serviços de abastecimento de água, colocando a questão da abolição da aplicação do regime reduzido de IVA para estes serviços.

Tendo presente os argumentos aduzidos na introdução ao ponto 6 e no ponto 6.1, do documento da Comissão que aborda especificamente a questão da taxa de IVA a aplicar à água, considerou oportuno a AIA – Associação Intermunicipal de Água da Região de Setúbal, responder à consulta pública promovida pela Comissão Europeia tendo manifestado, no dia 2 de janeiro, a seguinte posição:

1.    Da Politica Fiscal
Os impostos indiretos, sobre o consumo, são por natureza impostos que tendem a agravar a desigualdade de acesso a bens e serviços entre rendimentos baixos e rendimentos elevados, na medida em que afetam uma parte proporcionalmente maior dos primeiros, no limite impedindo ou reduzindo, para além do razoável, o consumo por escassez de renda.
Num momento em que na UE as desigualdades sociais e de rendimentos se agravam e em Portugal com grande severidade a generalidade dos rendimentos das famílias se contraem de forma significativa, com amplo impacto sobre o consumo, as condições de vida e a economia nacional o incremento dos impostos indiretos tenderá a agravar negativamente esta situação, não só, reduzindo a qualidade de vida dos cidadãos com menores rendimentos – e quando aplicado aos bens e serviços básicos, como a água a energia, etc., colocando em questão a dignidade da sobrevivência, como também terão um efeito multiplicador negativo na economia nacional por via da amplificação, da já de si relevante, baixa do consumo interno.
Portugal já aplica uma taxa ao uso de recursos hídricos a TRH, com a justificação de aplicação de um instrumento económico que incentive um uso racional da água. O aumento de uma taxa, que tem objetivo diferente – taxar o valor acrescentado ao bem água na natureza, ou seja incidir sobre o valor criado na transformação industrial do bem “água na natureza” em “água para consumo humano, com distribuição doméstica” a que procedem os operadores de serviços públicos de distribuição de água – sobre um mesmo argumento de âmbito ambiental, corre o risco de se constituir em dupla tributação.
A evocação de eventual contradição na aplicação de Taxa Reduzida de IVA aos consumos para fins produtivos/comerciais através das redes públicas e a suposta correção dessa situação com a aplicação de IVA à Taxa Reduzida é desprovida de qualquer sentido do ponto de vista económico e fiscal. As atividades produtivas/comerciais são desenvolvidas por sujeitos passivos de IVA, com a prerrogativa da dedução do imposto pago no imposto cobrado, logo não se constituí num custo de produção sendo indiferente a taxa aplicada.

2.    Da Politica Ambiental
O uso racional e sustentável da água é um objetivo que todos compartilhamos, bem como a preocupação relativamente à tendência para relação negativa entre disponibilidades e necessidades de água que se vem verificando a nível global, da UE e em Portugal. No entanto dois aspetos devem ser tidos em conta quando se trata de construir instrumentos que promovam o uso ambientalmente sustentável do recurso água: 1) O stress hídrico é heterogéneo na geografia da UE e dentro dos próprios Estados Membros. Assim acontece também em Portugal; 2) Apenas menos de 1/3 dos usos de água da EU (entre a escassez severa em Malta e a abundancia na Islândia e Noruega), e em Portugal, são afectos aos sistemas públicos de abastecimento para consumo humano, de entre esses a parte que se destina às atividades económicas e a usos domésticos fora da esfera das necessidades básicas serão uma parcela praticamente despiciente no cômputo geral.  
Assim, a tentativa de resolver por via fiscal amplificando e harmonizando de forma global o imposto direto sobre os consumos de água efetuados a partir dos sistemas públicos de abastecimento está por certo votada ao fracasso, não se vislumbrando que alcance outro efeito que não o de agravar as condições de acesso ao serviço das famílias de menores recursos económicos. Recomendando-se como mais adequado, por um lado, a implementação de políticas de preços de âmbito local, de acordo com o princípio da subsidiariedade, tratando diferente o que é diferente (stress hídrico) e por outro a implementação de políticas industriais e agrícolas que incentivem um uso sustentável da água, apontando assim à parcela significativa dos usos.

3.    Da Politica Social
Considerando a Aprovação pela Assembleia Geral das Nações Unidas, no dia 28 de Julho de 2010, com o voto favorável da grande maioria dos países da EU, entre eles Portugal, do Acesso à água e ao saneamento como direito humano, a taxação de um serviço que incumbe antes de mais aos Estados garantir aos seus cidadãos é já de si uma incongruência que urge sanar, a aumento dessa taxação constituiria um insistir nesse caminho contrário ao reconhecimento a que os Estados Membros da União deram corpo no âmbito da ONU.
A água para consumo doméstico é um bem cuja procura tem, reconhecidamente, uma baixa elasticidade. Nos últimos dois anos assistiu-se em Portugal a uma sensível redução do consumo das famílias, é de admitir que neste momento já se esteja próximo da capacidade de diminuição máxima de uso, pressionada pelo aumento de preço e diminuição do rendimento. O aumento do imposto sobre a água e consequentemente do seu custo final terá baixo impacto na redução das utilizações nos rendimentos elevados correndo o risco de contribuir para a marginalização do direito de acesso às quantidades necessárias à dignidade da vida das pessoas nos rendimentos mais baixos.
Num momento em que, na EU no seu conjunto e em Portugal com grande impacto, se generalizam políticas de redução da proteção social aos cidadãos, a intenção de passar as políticas de proteção do acesso aos serviços de água para outro âmbito que não o da prestação direta do serviço, independentemente da validade teórica da discussão, resultará na prática no desaparecimento ou na significativa redução desta proteção de um direito humano.

4.    Das políticas de tarifas e preços da água
Considera-se que a definição a nível local das tarifas e preços da água são a forma mais adequada de diferenciar corretamente a heterogeneidade das disponibilidades hídricas e de condições sociais existentes a nível dos Estados Membros e dentro deles, bem como de promover instrumentos económicos de desincentivo ao uso excessivo da água. Tal já acontece num amplo número de Estados membros da UE, nomeadamente em Portugal, onde um amplo conjunto de operadores aplicam tarifas por escalões, com base na implementação de instrumentos económicos de proteção dos consumos básicos e desincentivo aos consumos excessivos, aumentando sucessivamente ou por patamares o custo marginal de cada unidade consumida. Consideramos também que esta prática deve ser incentivada como instrumento de proteção ambiental e do direito de aceso à água, tendo em atenção as questões de especial carência económica e a equidade per capita do custo da água dos agregados habitacionais.

5.    Em síntese
A AIA manifesta-se contrária à abolição da Taxa Reduzida de IVA na água, no sentido da implementação da Taxa Normal, na medida em que esta decisão, não só, não se afigura a forma adequada de prosseguir as políticas ambientais e sociais invocadas, como poderá vir a produzir distorções nos equilíbrios da progressão marginal do preço, nos casos em que esta existe, na medida em que se aplicará de forma uniforme a toda a gama. Agrava esta convicção a situação de dificuldade generalizada das famílias que Portugal atravessa e o risco que esta medida comporta de amplificar a marginalização de muitos portugueses do acesso aos serviços de água e saneamento pelo agravamento do seu custo.